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Paulicéia
, 2018-2024



               
          
                  
                 
                 
                Paulicéia é um trabalho híbrido formado por uma escultura de concreto construída com uma edição fac-símile do livro “Paulicea Desvairada”, de 1922, de Mário de Andrade (1893-1945) recortada; uma ação escultórica e performática realizada na Rua da Consolação no centro de São Paulo; e um vídeo que registra tal ação.

                 O trabalho problematiza algumas noções como a de malha urbana e aquilo que mobiliza os interesses – políticos, econômicos, culturais – da vida social numa grande cidade. Apresenta, em sua evidência física, uma operação recorrente em minha produção: superfícies transplantadas a partir de procedimentos como deslocamentos, cortes e montagens. 

                 A obra toma como matéria o primeiro livro de poesia modernista brasileiro “Paulicea Desvairada”, escrito por Mário de Andrade entre 1920 e 1921, e publicado em 1992. Este livro foi escrito num cenário de mudanças de uma metrópole que encontrava-se em vias de modernização e urbanização, período que revela o processo de expansão demográfica na cidade. O livro é marcado por passeios do poeta pelas ruas da “Paulicea” desvairada – desvairada, nesse caso, quer dizer, desvario –, uma São Paulo que se desenvolvia a partir das contingências, das necessidades e do acaso, e que era apresentada pelo poeta como um palco. “As injustiças e os sofrimentos denunciados pelo poeta no seu passeio pela Paulicea” são revelados nos poemas a partir de uma crítica mordaz, em passagens ácidas e debochadas como em “Ode ao Burguês”. Há, em “Paulicea Desvairada”, um olhar crítico em relação às contradições e os contrastes complexos presentes no processo de modernização de uma das maiores cidades do mundo, descortinando de maneira burlesca, ao longo dos 22 poemas, problemas sociais.

                 “Da adversidade, vivemos”, como encontrar o poético no risco e na violência? Como vestir de poesia uma megalópole violenta, áspera e repelente? O que é uma cidade repleta de contrastes e contradições sociais travestida de poesia? Como vestir a cidade de poesia? Como pensar na ideia de um revestimento poético a partir de superfícies significantes nesse campo minado em estado de alerta?

                 Um losango presente na capa do fac-símile do livro “Paulicea Desvairada” foi recortado e extraído. Esse losango refere-se ao tipo de padronagem presente na roupa do arlequim, que reconstitui uma espécie de arquétipo da personagem bobo-da-corte conhecido pelas ácidas e críticas sátiras sociais que fazia. Tal losango, ainda, presente tanto na capa do livro como na malha ou veste do arlequim, também pode ser associado à ideia de mosaico, malha ou revestimento que recobre os calçamentos de grandes centros urbanos. O losango extraído foi incrustrado na malha urbana em uma das ruas da cidade de São Paulo citadas no texto, a Rua da Consolação. Um registro em vídeo foi realizado registrando essa ação.

                 Em Paulicéia foi construída uma escultura de concreto – material presente no vocabulário da cidade – na qual o livro recortado foi introduzido. O trabalho acontece lá e cá, cá e lá, no espaço de exposição e no “corpo” da cidade, ao trazer um pedaço físico do livro para a malha urbana e ao afixar o livro num fragmento do mosaico da cidade.

Thiago Honório, julho de 2019.










Ficha técnica

Paulicéia
, 2018-2024
Fac-símile do livro Paulicea desvairada (1922), de Mário de Andrade; concreto
34,4 x 25,2 x 3,5 cm

Fragmento do fac-símile do livro Paulicea desvairada (1922), de Mário de Andrade, incrustado no calçamento da rua da Consolação, no centro da cidade de São Paulo, no dia 10 de março de 2024

foto: Edouard Fraipont, Ana Pigosso


Exposições

Leituras
, Biblioteca Mário de Andrade, SP, 2024





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